A Venezuela vive uma crise econômica e humanitária gravíssima, que já levou 7 milhões de pessoas a deixar o país, colocou quase 95% da população na pobreza e a ditadura de Nicolás Maduro segue agindo com truculência contra os opositores do regime. E, ao contrário do que a propaganda oficial tenta fazer parecer, “a Venezuela não está consertada”.
A afirmação é de Pedro Urruchurtu, cientista político e coordenador de assuntos internacionais da Vente Venezuela, partido político comandado por María Corina Machado, a principal líder da oposição.
Em entrevista a Oeste, o analista disse que há 284 presos políticos, que a perseguição a opositores e a violação aos direitos humanos prosseguem e que os dados negativos da economia – inflação acelerada, baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), dolarização de praticamente todo o comércio – podem ser observados no dia a dia do país. Há fome, miséria, doenças e ausência quase completa de serviços públicos. “O país está longe de ser consertado. A crise é severa e hoje ainda existem milhões de venezuelanos que permanecem sob controle e na miséria.”
Ele também comentou a recepção calorosa dada a Maduro pelo presidente Lula. “Existe cumplicidade”, observou. “Lula não se calou sobre as violações dos direitos humanos. Foi pior. Afirmou que fazem parte de uma narrativa construída.”
Confira, abaixo, a entrevista com Pedro Urruchurtu.
1 — Como é viver na Venezuela hoje?
Os dados confirmam a realidade: a Venezuela é um país onde a maioria de seus cidadãos está submetida à miséria. Mais de 7 milhões idosos aposentados vivem com menos de US$ 5 por mês, só para dar um exemplo. Não podemos ignorar o fato de que um número similar de venezuelanos teve que deixar seu país em busca de melhores oportunidades.
A crise é generalizada em termos de falhas no serviço público, poder aquisitivo, destruição do sistema educacional e do sistema de saúde. Apesar de uma operação de propaganda, de que o regime e seus aliados internos e externos tentaram vender para o mundo exterior, que “a Venezuela está consertada”, o país está longe de ser consertado.
A crise é severa e hoje ainda existem milhões de venezuelanos que permanecem sob controle e na miséria. A maioria absoluta do país está unida na decência e na vontade de viver melhor, enquanto um pequeno grupo corrupto sequestra as instituições e vive ostensivamente em detrimento dos cidadãos. Esse contraste é perceptível e as pessoas o veem no dia a dia. A indignação cresce.
2 — Qual o impacto da emigração forçada ao longo dos últimos anos?
Quando 25% dos venezuelanos foram forçados a migrar, ou seja, um quarto da população, você entende a magnitude do dano que o chavismo causou. Não é apenas a destruição institucional, política, econômica. É o colapso familiar, a separação intencional da família. É comum vermos casas no campo onde os avós criam os netos porque os pais, ou seja, a geração média, emigraram para poderem sustentar as suas famílias.
O mais importante é entender que isso foi planejado, foi intencional. Hoje a Venezuela constitui a maior crise de migrantes e refugiados do mundo, quase tão dramática quanto ter vivido uma guerra, quando não foi o caso. O país está mais unido do que nunca porque esta tragédia fez com que todos tivéssemos um familiar ou amigo próximo no exterior. As pessoas preferem a incerteza de ter que fugir expondo-se a uma série de perigos, do que a certeza de morrer de declínio na Venezuela.
3 — A perseguição aos opositores continua?
Ela não apenas continua, mas como é sistemática. Fazer política na Venezuela enquanto dissidente do regime implica riscos e perigos profundos, desde a liberdade de movimento até o assédio permanente. A polícia política está em permanente vigilância e intimidação. Além disso, até hoje, existem 284 presos políticos, em um país onde qualquer um pode se tornar um deles por se opor à tirania.
Sem contar a perseguição à imprensa, cada vez menos livre, e a censura institucionalizada para violar permanentemente a liberdade de expressão. Chantagem, extorsão, perseguição são formas de agir de um regime criminoso. Por exemplo, a líder do nosso partido, Vente Venezuela, María Corina Machado, não pode fazer voos comerciais dentro do país, pois o regime proibiu as companhias aéreas privadas de vender passagens.
Da mesma forma, ela está proibido de sair do país por dez anos devido a uma medida ilegal e arbitrária. Isto significa que tem de percorrer o país por via terrestre, sujeita à vigilância permanente. Esse é apenas um dos testemunhos e das formas como o regime age e a que qualquer opositor está sujeito simplesmente porque pensa diferente.
4 — ONGs e até mesmo o Tribunal Penal Internacional (TPI) apontam graves violações aos direitos humanos na Venezuela. O senhor conhece esses casos?
Esta é uma realidade dolorosa à qual centenas de venezuelanos foram submetidos, juntamente com a repressão. Por isso, o fato de o TPI estar avançando na investigação sobre o cometimento de crimes contra a humanidade pelo regime é uma notícia animadora na busca por aquela justiça que o regime negou aos venezuelanos. O trabalho do TPI deve ser apoiado e o trabalho das organizações deve continuar a fornecer provas e testemunhos do que o regime fez.
O fato de 8.900 vítimas terem contado recentemente sua história e pedido a retomada das investigações é um sinal da necessidade de justiça, mas, sobretudo, de que a verdade seja dita. A mídia, a opinião pública, as ONGs, os líderes democráticos, todos devem promover esse trabalho. O que o regime fez não é uma narrativa construída ou uma mentira, como o presidente do Brasil, Lula, quis apontar. Muito menos é um preconceito. É uma realidade inegável. Seu questionamento é uma ofensa para as vítimas.
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